Universidade Portucalense – Infante D. Henrique

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“A agressão da Rússia desafia diretamente a ordem nuclear global”

No dia 30 de novembro, a Universidade Portucalense acolheu as “Conferências do Castelo”, do Instituto de Defesa Nacional. Em debate esteve a proliferação nuclear e os desafios associados à segurança europeia.

“Do ponto de vista democrático, da legitimidade e soberania popular, qualquer enquadramento nuclear exige pelo menos três compromissos profundos dos cidadãos de estados com armas nucleares. Em primeiro lugar, os cidadãos são chamados a financiar a produção e manutenção de armas nucleares através de impostos. Em segundo lugar, são obrigados a aceitar tacitamente que o seu estado se tornará um alvo no caso de uma guerra nuclear mais ampla. Em terceiro lugar, espera-se que os cidadãos ofereçam apoio tácito para a possível implementação de uma política que levaria à chacina indiscriminada de um grande número de civis e que potencialmente causaria perturbações climáticas, ecológicas, humanitárias e sociais muito duradouras”, argumentou André Matos, docente e coordenador da licenciatura em Relações Internacionais.

No entender de André Matos, “o dano causado pela Rússia pode repercutir muito além das fronteiras territoriais da Ucrânia”, uma vez que a Rússia ao “usar o seu arsenal nuclear como ferramenta para permitir crimes de guerra, a tentativa de destruição da soberania de outro estado e ataques imprudentes à infraestrutura nuclear civil, dá golpes duros na já muito delicada ordem nuclear global”. 

Destacou como consequência do comportamento russo num sistema instável a candidatura à NATO da Finlândia e Suécia, países historicamente neutros, que “reforçaram a dissuasão de um ataque aos seus territórios sob o guarda-chuva nuclear da NATO”. 

“A verdade é que o perigo se adensa: a agressão da Rússia desafia diretamente a ordem nuclear global, desde tratados multilaterais de longa duração a suposições sobre a usabilidade de armas nucleares em conflito. No improvável caso de a Rússia utilizar armas nucleares na Ucrânia, as suas consequências pragmáticas, materiais e psicológicas, seriam consideravelmente amplificadas. Se a guerra terminar sem a utilização nuclear, a consciência pública renovada sobre armas nucleares permanecerá e ajudará a determinar o futuro da ordem nuclear global”, frisou. 

André Matos considera que estamos “num momento determinante: de teste de resiliência e capacidade homeostásica do sistema internacional vigente, dos seus valores e do equilíbrio de poder que ele comporta; a guerra na Ucrânia não é apenas um conflito armado circunscrito a interesses territoriais específicos, mas um desafio e um teste a todos os valores e estruturas que este sistema consolidou ao longo dos últimos trinta anos”. 

Explanou: “A derrota russa na Ucrânia equivaleria a um anúncio sobre os perigos da tentativa de engrandecimento militar, mesmo que seja apoiada por armas nucleares. A vitória russa anunciaria o poder coercitivo de armas nucleares e a vulnerabilidade dos Estados que não as possuem.  Assim, quanto mais a Rússia é recompensada pela sua guerra, maior o perigo para o mundo e a constatação da incapacidade das estruturas entretanto criadas para reduzir as ameaças nucleares.  Se, pelo contrário, o ressurgimento de armas nucleares no centro do cenário mundial configurar prova suficientemente chocante, poderá até ser possível melhorar a estratégia de governança nuclear e potencialmente avançar para um ainda longo e muito instável caminho para a sua abolição.”

André Matos concluiu, afirmando que “a União Europeia terá, após o conflito, uma oportunidade privilegiada para repensar o seu posicionamento estratégico sobre um tema que tem sido evitado diplomaticamente que é o da eventual europeização das armas nucleares ou, pelo menos, o da assunção de um sistema de defesa mais articulado e interdependente do ponto de vista interno da União e menos do exterior”. 

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